MundoBola Flamengo
·23 avril 2025
Adeus à Geral: há 20 anos, o Maracanã mudava para sempre

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Maracanã: o gigante adormecido. No dia 23 de abril de 2005, o clássico estádio brasileiro se despedia de sua alma popular, iniciando um processo de elitização que perdura, se concretiza e jamais parou.
Duas décadas depois, torcedores, e até o ídolo Andrade, que comandou a equipe na beira do campo naquela partida, relembram o impacto do fim da Geral, que mudou "a casa do inesquecível", como o novo Maracanã se denomina, para sempre.
A Geral do Maracanã era símbolo popular, principalmente pelos preços acessíveis dos ingressos, mas também por transformar o estádio em um caldeirão em jogos do Flamengo. Foram décadas sendo a alma da torcida, em um anel mais próximo ao gramado, sem cadeiras e apenas com uma grade baixa separando os torcedores do campo.
Colado à linha de fundo, os torcedores assistiam ao jogo em pé, no setor mais barato do estádio, criado desde a inauguração, em 1950. Ir de Geral era participar de algo maior, e não apenas assistir ao jogo, mas fazer parte dele. Características que podem não ser encontradas no Maracanã desde então.
Na beira do campo, Andrade era o técnico do Flamengo no jogo contra o Cruzeiro, pela primeira rodada do Brasileirão de 2005, que marcou o último jogo do Mengão com a Geral. Ele trabalhou como interino, após a queda de Cuca, e antes da contratação de Celso Roth, no fim de abril.
Em entrevista exclusiva ao MundoBola Flamengo, o ídolo deu depoimento emocionante ao lembrar das diferenças do Maracanã com e sem a Geral, já que ele viveu, mais tarde, o estádio sem esse setor, já como treinador.
Para Andrade, ter a Geral propiciava um ambiente diferente no Maracanã. Além disso, os torcedores próximos do gramado exerciam influência direta na forma como os adversários atuavam.
"Era diferente, cara. Era diferente o Maracanã com a Geral, e sem. Não era a mesma coisa. A pressão da torcida era diferente sem a Geral. A Geral era importantíssima, fundamental para desequilibrar o adversário. Muda muito, é completamente diferente", inicia.
Ele lembra dos públicos impressionantes que era permitido ao Maracanã, com a Geral sendo o coração da Nação para empurrar o Flamengo.
"Tivemos a experiência, a oportunidade de jogar em uma época maravilhosa, com 140, 150 mil pessoas. Hoje, infelizmente, não cabe mais esse público. Justamente, esse público da Geral, que ocupava aquele espaço ali na beira do Maracanã. A presença deles era fundamental para a gente", continua.
Por fim, o ex-jogador e técnico do Flamengo, multicampeão pelo clube, diz que os jogadores estavam acostumados com a torcida perto, na Geral, enquanto os adversários tinham fortes dores de cabeça.
"Na época do Maracanã com Geral, era fundamental. A pressão que as pessoas exerciam sobre o adversário, sabe? Para nós, jogadores, a Geral estava muito próxima. Isso era determinante, até para ir em busca dos resultados. A pressão que eles exerciam contra o time adversário. Era fundamental, durante todos aqueles anos. Eles ficavam muito próximos, a pressão era muito grande. Nós estávamos habituados com a Geral, estávamos acostumados com isso. Então, para a gente, era como se fosse mais um jogador em campo", conclui.
Na primeira rodada do Brasileirão 2005, os torcedores já foram ao Maracanã sabendo que aquela seria a última vez na Geral.
Isso porque a Fifa só permitia torcedores em locais com lugares para sentar. Por isso, o estádio precisou se modernizar para poder ser utilizado em jogos internacionais.
Isso fez com que as cadeiras tomassem conta do setor, e os rubro-negros tiveram que se despedir da Geral no dia de São Jorge.
Em campo, o Cruzeiro abriu o placar com Fred aos 21 minutos do primeiro tempo, após falha de Fabiano, pelo lado esquerdo da defesa.
Coube a Júnior Baiano marcar o último gol do Flamengo com a Geral no Maracanã, no último lance da partida, evitando uma derrota na data especial.
Para entender o setor popular, basta olhar o preço da Geral na sua última partida de existência com a Nação. O setor popular, no seu último dia de vida com a Nação Rubro-Negra - já que ainda se despediria com um jogo do Fluminense - custou apenas R$ 5.
Os preços, aliás, eram bem diferentes naquela época. Nesse jogo de 2005, contra o Cruzeiro, o Flamengo recebeu um público de 10.720 pessoas. A renda bruta da partida foi de R$ 158.951,00. Ou seja, o ticket médio do jogo foi de R$ 14,83.
Com média de ingressos por R$ 15, o Maracanã, como um todo, era muito mais popular do que o atual estádio.
Como comparativo, o último jogo como mandante no Campeonato Brasileiro pode servir de base. O Rubro-Negro recebeu o Juventude na última quarta-feira (16), e o Maracanã teve preços muito mais elevados.
Ou seja, considerando o valor cheio dos ingressos, o ticket médio foi de R$ 200. Isso é 13,5 vezes mais caro do que o valor do jogo em que a Nação se despediu da Geral, e ilustra a elitização ao longo dos anos.
E essa nem é a partida mais cara. O confronto de Libertadores contra o Central Córdoba, por exemplo, foi de R$ 216,67, valor 14,83 vezes mais caro do que o jogo de 2005. Veja os detalhes da precificação abaixo.
Ao MundoBola Flamengo, Merica, antigo geraldino, ou seja, torcedor que frequentava a Geral do Maracanã, lamentou a elitização.
"Hoje os torcedores ícones do Flamengo, muitos deles com grande representatividade, não podem ir ao Maracanã com o ingresso a R$ 120. Os geraldinos estão afastados", diz.
Ele lembra que a Geral pertencia ao povo, e hoje, lamenta que o povo está excluído.
"Aquele Maracanã acabou. Era do povão. Hoje, é elitizado. Conheço muita gente que chora por não ter condições de ir ao Maracanã", conclui.
O torcedor Fábio de Souza, de 49 anos, que vai aos jogos caracterizado como Homem de Ferro Rubro-Negro, lembra histórias inesquecíveis da Geral. Ele recorda, com alegria, de partidas que assistiu no setor.
"Quando eu fui de Geral, fui contra o Grêmio, em 97, 2 a 2, Copa do Brasil. Fui em 95, contra o Botafogo, 3 a 2, gol do Romário, Taça Guanabara. Fui 99, contra o Vasco, 2 a 1, gols de Romário e Athirson. Fui em 2004, Santo André, a pior derrota de Geral que já tive", inicia.
No último jogo do Flamengo na Geral, Fábio pôde se despedir.
"Em 2005, na despedida, estava de cadeira, mas depois pulei para a Geral. Saudades que sempre ficarão guardadas nos nossos corações. Tempos que não voltam mais. Momentos bons. Lá, foram conhecidos vários torcedores ícones. Santa Cruz, Valderrama, Zica, Geraldo, Merica, Samuca. Torcedores das antigas. São lendas", comenta.
Por fim, o rubro-negro sonha com uma nova Geral no novo estádio do Flamengo.
"Participei desse momento bom de Geral. Mas infelizmente, tudo que é bom, dura pouco. Quem sabe o Bap faz uma Geral no estádio novo do Flamengo. As histórias ficam nas lembranças da gente", conclui.
A saudade do antigo Maracanã é eterna, e as reformas foram tantas que o estádio, para muitos, já não é mais o mesmo. Apesar disso, o local segue vendo a construção da história do Flamengo, principalmente com uma nova Era de conquistas recentes.